Olhares sobre uma SP em formação
Exposição fotográfica de Stefania Bril no IMS/SP recupera o olhar sobre uma cidade em formação e em transformação nos anos 1970. Uma polonesa que se fez brasileira através da desobediência e do afeto.
Visitar a exposição fotográfica Stefania Bril: desobediência pelo afeto, em cartaz no Instituto Moreira Sales (IMS), em São Paulo, é como pegar um bonde que não existe mais ou mergulhar em cenários modificados pelo tempo e pela ação da “força da grana que ergue e destrói coisas belas”, como nos versos de Sampa, de Caetano Veloso. A cidade é a mesma, mas é outra. Um lugar menos ou mais hostil? Depende de quem vive, de onde se vive e de qual ponto de vista se fala da capital paulista dos anos 1970.







Galeria: Acervo do Instituto Moreira Sales/SP/Stefania Bril/Reprodução
Uma hora nosso olhar se perde no tempo, entre o Vale do Anhagabaú em transformação no início da década de 1970 e as figuras humanas que povoavam os bairros da cidade naquele período. Em suas poses, momentos de descontração, trabalho ou perdidos pelos labirintos e ruas à procura de qualquer coisa para viver ou comer. A miséria e o capital se misturam e acabam sendo captados pela visão de Stefania, uma polonesa que aportou por aqui após a Segunda Guerra Mundial e viu em São Paulo o seu novo território onde construiria sua carreira.
O IMS guarda e preserva o acervo da fotógrafa, com mais de 11 mil registros - tendo uma pequena, mas expressiva parte da sua coleção exposta até 26 de janeiro de 2025 na sede da instituição, na Avenida Paulista.
Alguma capturas feitas por ela viraram clássicos, como é o caso do outdoor que foi exposto pelo banco Bradesco em cima de barracos de uma comunidade paulistana onde se lê a irônica frase “Moleza” (que seria, naquele tempo, investir em fundos daquele banco), em contraste que era morar por ali. Ou o senhor que dorme, mas “não pisa” na grama. Tem as caixas de frutas empilhadas no Ceasa e tantas outras cenas.






Galeria: Acervo do Instituto Moreira Sales/SP/Stefania Bril/Reprodução
Muita gente botou o rosto para ficar no registro de Stefania naquele tempo, mostrando uma diversidade e uma beleza que nem sempre se atribui a um lugar como a capital das dezenas de povos, migrantes e imigrantes. Ela mesma tem uma foto icônica montando o equipamento para fotografar (galeria acima). Tem ruas comerciais e espaços públicos depois privatizados, como ocorre com boa parte do Centro Histórico do município nos últimos anos.
A exposição acaba sendo um delicioso passeio por lugares que nem todo mundo viu ou se recorda como era antes das mudanças e transformações que levaram São Paulo a ser a maior metrópole da América Latina - atualmente com mais de 12 milhões de viventes espalhados pelos seus quatro cantos.
Recomendo a visita para que se possa ter a impressão da grandeza e das fragilidades que a memória de uma cidade revela a cada tempo. E que somente a fotografia, o cinema e outras modalidades de arte são capazes de reter.