Reencontrei Almodóvar. E ele está bem!
Após 8 anos sem ver um filme do diretor espanhol, "O Quarto ao Lado" mostra o vigor de Almodóvar ao 75 anos. Segue acostumado a perturbar espectadores com temas espinhosos, humor ácido e inteligência.
Cena de “O Quarto ao Lado"/Crédito/Warner/Divulgação
Confesso que passo longos anos sem ver alguma produção cinematográfica de Pedro Almodóvar. Minha relação com ele é a mesma que mantenho no cinema com Quentin Tarantino, outro que admiro absurdamente, mas que pulo filmes, vejo anos depois ou simplesmente deixo de lado até redescobrir seu universo. E o que me trouxe de volta ao mundo do diretor espanhol foi O Quarto ao Lado (2024), uma exploração forte e sensível da eutanásia, da vida e da morte.
Nem vou me alongar muito para falar do novo filme de Almodóvar. Apenas recomendo fortemente. Todo mundo vai se identificar com o drama vivido por Martha (Tilda Swinton), dividido com a amiga Ingrid (Juliane Moore). Não se trata de concordar com o que a personagem encarna, mas encarar os desafios de quem não tem para onde correr em determinadas situações da vida.
E vamos combinar que um filme que tem Juliane Moore escalada no elenco já pede para ser visto. Atrizes e atores como ela e outros com quem contracena raramente entram em roubadas de roteiro.
Imagino que você vai querer assistir O Quarto ao Lado. Nem que seja pela curiosidade porque eu vou falar pouco dele aqui.
FILME MARCANTES - Deixando o filme um pouco de lado, volto as teclas para o criador dessas tramas e o que me faz voltar de tempos em tempos à sua filmografia. Lembro-me de Volver (2006), com Penélope Cruz, que trabalha os dramas do passado a partir do fantasma da mãe da personagem. Gosto desse cinema cortante.
Quem assistiu ao fortíssimo A Pele que Habito, com Antonio Banderas (2011), sabe o quanto atual é o cinema de Almodóvar em relação a temas sensíveis - que recentemente recebeu um reforço na discussão sobre a ditadura da beleza e as perversões masculinas em A Substância - esse da diretora francesa Coralie Fargeat.
Tudo sobre a Minha Mãe (1999) me fez rir e chorar. E Julieta tem todas as receitas do diretor numa única película. Alguns dos clássicos dele eu perdi e vou assistir a partir dessa viagem em seu novo filme.
Foto da capa do livro de Pedro Almodóvar/Companhia das Letras
AUTOBIOGRAFIA - Como uma máquina de rabiscar ideias sem parar, Pedro Almodóvar lançou, em junho deste ano, uma autobiografia que meio que engana todo mundo. No livro, faz recortes do cinema, da vida, dos dramas e aprendizados com a mãe e fala do seu conturbado processo criativo. Você sabe que é ele falando, mas podem ser esses personagens todos que leva à tela. O cara é mestre na confusão mental a partir das imagens e, claro, das palavras.
A propósito, como em toda a sua filmografia, nunca você encontrará um diálogo perdido num filme de Pedro Almodóvar. Você pode até ficar chocado ou chocada, mas sabe exatamente o que aquela fala faz ali. E o que faz tal personagem ser treloucado/a naquele nível. É o próprio falando, ora no estilo do seu livro, ora no seu cinema.
ENCURRALADA (O) - Por fim, volto a dizer: ao ver O Quarto ao Lado, certamente você ficará pensando que tudo aquilo pode acontecer com você ou com alguém do seu círculo. O que você faria se estivesse encurralado ou encurralada? Coisas para se pensar. Só assistindo mesmo.