Uma saborosa viagem na língua portuguesa
O livro "Latim em pó - Um passeio pela formação do nosso português", de Caetano Galindo, mira o desejo de sabermos mais sobre a linguagem, sem perder de vista o sabor das narrativas que nos prendem.
O domínio da linguagem por nós seres humanos é apresentado de maneira mágica pelo professor, tradutor e linguista paranaense Caetano W. Galindo no livro Latim em pó - Um passeio pela formação do nosso português (Companhia das Letras, 2023). A obra é permeada por uma narrativa que prende o leitor ou leitora a cada passo, pois se utiliza de trechos lineares da história para traçar os tortuosos caminhos que nos levaram a sermos como somos no universo linguístico mundial.
Galindo trata, logo de início, de colocar em xeque algumas teorias difundidas desde a escola e que se espraiam na imprensa e no senso comum que dariam ao português uma aura de “língua complicada” e difícil de aprender e de compreender. Usa como contraponto justamente a ‘simplicidade’ do inglês, utilizado por muitos como exemplo de língua enxuta e fácil. “Eles que precisam se explicar”, diz o autor, ao mostrar que, à exceção do idioma shakespeariano, praticamente todo o conjunto das linguagens tem semelhanças com a nossa língua em matéria de estrutura. Portanto, temos riqueza na composição idiomática, mas não somos nada complexos como difundiram.
Ainda nessa perspectiva, o professor da Universidade Federal do Paraná, notabilizado pela sua tradução de Ulysses, do irlandês James Joyce, cutuca os que usam certas formas gramaticais e de gênero no português para atacar o idioma de Camões e da brava gente brasileira. E cita diversos casos em línguas ao redor do mundo com centenas de sentidos diferentes para uma única palavra, a partir de pronúncias ou de suas formas ‘cantadas’, com o uso da língua e dos dentes pelos falantes.
Um ponto interessante nessa linha de investigação que o livro propõe, na perspectiva comparativa, diz respeito à curiosa característica ‘monolíngue’ conservada pelo Brasil, um caso raro no mundo, que tem a ver com nossa formação histórica e processos internos de colonização, de poder e de difusão idiomática, de costumes de necessidades da população que moldou esta terra, entre os séculos XVI e XIX. O autor cita o caso da Nigéria, país africano com população pouco superior à brasileira, que convive com mais de 500 diferentes idiomas. Não são dialetos, lembra ele, mas línguas completas, faladas em diferentes pontos daquele território.
O passeio referido no subtítulo do livro de Galindo faz todo o sentido. Embora não seja um compêndio de história, o linguista usa fios da história humana e das línguas para nos levar aos lugares mais remotos do Latim, a língua do Lácio da qual somos herdeiros, além de outros povos que um dia estiveram nas fronteiras do Império Romano. E traz elementos que nos parecem bem distantes no tocante ao surgimento desse modo de falar, escrever e se comunicar que nos é comum.
Entre um passeio e outro, quem devora o livro de Caetano Galindo sabe que está em mãos com um exemplar que o prenderá desde o começo. Que usa como ponto de partida a provocação do cantor e compositor baiano Caetano Veloso em sua música Língua, que contém a saborosa - e instigante expressão Latim em pó, e dá título ao livro. Vamos entender de qual “latim” o escritor está falando, reforçando o sentido dado pelo cantor em sua canção.
Em suma, trata-se de um livro que você pode comprar sem medo, ler com prazer e espalhar para amigos e amigas como uma viagem que vale a pena fazer. Para quem usa o português como ferramenta de trabalho. Para quem gosta de aprender ou, simplesmente, para quem morre de curiosidade sobre como falamos e o que falamos, seus caminhos e suas variantes.
Eu que agradeço, Jônatas, pelas suas palavras gentis, pela leitura dos textos, atenção aos podcasts e por assinar a newsletter e acompanhar tudo por aqui. Você é um leitor, escritor e um colega que respeito muito. Abraços e grato pelo contato!
Djair
Muito obrigado, caro Oswaldo! O livro realmente vale a pena! Pelas novidades e pelo estilo!
Abraços!